Revista de Economia e Sociologia Rural
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Revista de Economia e Sociologia Rural
ARTIGO ORIGINAL

CERCAMENTO DOS CAMPOS: UMA PERSPECTIVA PARA COMPREENSÃO DO CARÁTER DA SUBORDINAÇÃO DA AGROPECUÁRIA AO CAPITAL NO BRASIL PÓS-64

ALBERTO DA SILVA JONES; MATHEUS BRESSAN; JOSÉ SOLON GUERRERO GUTIERREZ; EDGARD DE VASCONCELOS BARROS

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Resumo

Analisa-se o caráter e a lógica do processo de privatização da propriedade fundiária en- quanto componente fundamental do processo de expansão do modo capitalista de produção nas suas fronteiras com a agropecuária brasileira nos últimos anos, especialmente no peáodo que se seguiu à aprovação do "Estatuto da Terra" em novembro de 1964. Com base na análise de documentos e da- dos censitários dos anos de 1960, 1970 e 1980, referentes à expansão das áreas dos estabelecimentos agropecuários, sua variação diferencial e desigual por estratos de áreas e regiões, e dos níveis de utili- zação e destinação dada às terras então apropriadas, bem como seus efeitos sobre os movimentos de- mográficos, evidencia-se que o caráter desse processo de expansão do capital sobre as fronteiras agropecuárias foi, sobretudo e primordialmente, o da chamada acumulação primitiva, através da qual o capital apropria-se, sem necessariamente produzir, de riquezas naturais e/ou criadas pela pequena produção. Busca-se esclarecer como esse processo significa a estruturação e desenvolvimento da pro- priedade privada burguesa na agricultura, pela destruição da propriedade ou posse, não importando o caráter juádico dos produtores diretos. Evidencia-se igualmente o caráter de violência e ilegalidade embutidos nesse processo e a conivência de setores importantes da burocracia estatal, o que reforça, definitivamente, o seu caráter de acumulação primitiva. Registra-se também, e com ênfase, a especi- ficidade desse processo de acumulação primitiva enquanto um fenômeno de cercamento dos campos pelo grande capital nacional e multinacional e suas articulações com os mecanismos especificamente capitalistas de subordinação da agricultura ao capital através do monopólio do processo produtivo. Fica evidenciado pela pesquisa que a política fundiária do Estado, no peáodo, foi a consagração desse processo, sem precedentes na história do país, de concentração fundiária e destruição da peque- na produção como recurso à preparação do terreno para a plena subordinação da agropecuária brasi- leira ao grande capital. Finalmente chama-se a atenção para o risco dessa estratégia de "moderniza- ção consevadora" ou "dolorosa", baseada na aliança entre a propriedade fundiária e o capital como opção para a subordinação da agricultura, na medida em que esta aliança de classes pode significar, no médio e longo prazos, uma "punição" sobre a mais-valia em favor da propriedade fundiária, o que pode vir a se configurar em um sério bloqueio ao desenvolvimento, não apenas da agropecuária, mas da própria reprodução ampliada da formação econômico-social brasileira.

Palavras-chave

agricultura e estado, agricultura e capitalismo nas fronteiras agrícolas, acumulação de capital na agricultura, política fundiária, terras agrícolas, padrão de utilização.

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Submetido em:
30/05/1987

Aceito em:
04/12/1987

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